Zeenix da Tectoy: o Console Brasileiro que foi do Céu ao Inferno em menos de um Ano

Provavelmente (a Tectoy) terá seu passado e legado enterrados ao longo dos próximos anos, assim como aconteceu com os cartuchos do jogo E.T. da Atari algumas décadas atrás.

No final de junho de 2024, a Tectoy anunciou seu mais novo e ambicioso projeto: o Zeenix, um PC/console portátil brasileiro, para concorrer com gigantes como Nintendo Switch, Steam Deck e ROG Ally. A comunidade gamer verde-e-amarela ficou empolgada, especialmente após a apresentação detalhada do console na Gamescom LATAM de 2024. Eu mesmo tive a oportunidade de testar o modelo Lite, em 30 de junho, quando fui ao evento.

Eddy Antonini, porta-voz do Zeenix, participou de inúmeros podcasts, publicou diversos vídeos e conseguiu deixar a comunidade bastante entusiasmada com o console, que na época ainda não tinha uma data oficial de lançamento. Mesmo sem precisar, eu estava inclinado a adquirir um Zeenix, dependendo do preço.

Desconfiança e falta de transparência

Passaram-se algumas semanas, e a internet, que não perdoa, começou a pressionar a Tectoy. O principal problema, a meu ver, não foi o fato do produto ser um white label do console Ayn Loki Zero, importado da China, mas sim a Tectoy ter omitido essa informação em sua comunicação e marketing. Para quem não sabe, produtos white label são importados geralmente do mercado chinês, um dos maiores polos tecnológicos do mundo, e, ao chegar ao destino, recebem uma marca própria do importador.

Durante a Gamescom e semanas seguintes, diversas vezes foi prometido que o preço e a data de lançamento seriam anunciados em breve. Contudo, o primeiro lote da versão Lite do console, a menos robusta, foi lançado somente em novembro de 2024, pelo valor inicial de R$ 2,6 mil. Após a venda desse lote inicial, o preço subirá para impressionantes R$ 3,3 mil.

Ayn Loki Zero: qualquer semelhança com o Zeenix não é mera coincidência.
Ayn Loki Zero: qualquer semelhança com o Zeenix não é mera coincidência.

A título de comparação, hoje é possível comprar um Xbox Series S no Brasil, com direito a nota fiscal e garantia, por R$ 2,5 mil. Um Nintendo Switch Lite sai por R$ 1,3 mil. Já o Steam Deck LCD de 64 GB pode ser encontrado por cerca de R$ 3,6 mil. Na minha opinião, por diversos motivos, todos esses consoles são melhores que o Zeenix Lite.

Entendo perfeitamente as dificuldades inerentes à comercialização de um produto tecnológico próprio em nosso país. O Brasil vem sendo desindustrializado há tempos; nossa economia gira basicamente em torno de commodities, sem mencionar a moeda desvalorizada, inflação e impostos exacerbados, inclusive sobre itens importados. No entanto, talvez o Zeenix tivesse maiores chances de sucesso se a Tectoy tivesse agido com transparência e seriedade com seu público desde o começo. A comunidade brasileira fã de videogames é extremamente engajada e apaixonada, frequentemente gastando o dinheiro que não tem para comprar jogos novos, videogames e hardware em geral, por exemplo. Possivelmente, abraçariam a causa, especialmente se o console fosse mais acessível.

Zeenix vai de Zeebo

Na última semana, Pedro Caxa, ex-head de marketing da Tectoy e responsável pelo projeto Zeenix, publicou um vídeo em suas redes sociais informando que não faz mais parte da empresa e que praticamente toda a equipe responsável pelo Zeenix deixou a Tectoy. Segundo ele, houve um descolamento entre o propósito e a visão da equipe do Zeenix e os executivos da Transire, empresa proprietária da Tectoy.

Apesar de essa notícia ter caído como uma bomba sobre o futuro do Zeenix, em nota ao veículo Omelete, a Tectoy afirmou que “a divisão de games da Tectoy segue totalmente empenhada nas iniciativas relativas ao Zeenix. As mudanças no time, realizadas em diferentes circunstâncias ao longo do último ano, em nada alteram o cronograma de lançamento dos produtos”.

Mesmo que o Zeenix Pro seja lançado e o Zeenix Lite seja mantido à venda, é evidente que o produto já não é o mesmo de um ano atrás. As mentes por trás do projeto sequer permanecem na empresa. Sinceramente, acho difícil que o Zeenix Lite seja reposto após a venda do lote inicial, e provavelmente a sua versão Pro nunca sairá do papel.

Zeebo: mais um fracasso da Tectoy.
Zeebo: mais um fracasso da Tectoy.

O público do Zeenix em breve passará a ser apenas os colecionadores entusiastas de itens raros. Logo o console valerá bastante em nosso mercado inflacionado de colecionismo de games. E, infelizmente, se juntará ao saudoso Zeebo como mais um fracasso da Tectoy. A empresa fundada em 1987, responsável pela importação e comercialização dos consoles da Sega no Brasil e por alegrar a infância de milhares de brasileiros dos anos 80 e 90, como eu, já perdeu sua identidade, tendo sido incorporada por uma empresa de soluções de pagamento. Provavelmente terá seu passado e legado enterrados ao longo dos próximos anos, assim como aconteceu com os cartuchos do jogo E.T. da Atari algumas décadas atrás.

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